Se é sabido que não se deve julgar um livro pela sua capa, o mesmo…
O impacto das opiniões dos amigos nas nossas provas
28 de Maio de 2017. 11ª Edição da Corrida ao Farol (Burinhosa, Marinha Grande). Último quilómetro.
Aproximava-me eu a passos largos da meta. Há já bastante tempo que vinha em falso plano a descer, e tinham-me dito que a prova tinha uma longa subida na parte final.
Assim, a ansiedade aumentava em relação às dificuldades com que me podia deparar a qualquer instante. Por fim, o declive positivo chegou mesmo. Uma inclinação que talvez tenha compensado a negativa dos quilómetros anteriores. Apesar disso, a subida era bem mais curta do que estava em perspetiva. Cerca de 400m?!
Já no passado dia 25 de fevereiro, depois de ter cortado a meta em mais uma edição do G.P. de Atletismo Cidade de Estarreja, ouvi muitos comentários do género:
Prova dura, não contava com isto …
Disseram-me que a prova era planinha e afinal …
Reações e sentimentos que me levaram a questionar o seguinte. Andamos a ser enganados por aqueles a quem pedimos feedback das provas? Desde essa altura que ando para escrever este artigo.
As fontes de informação sobre as provas
A tendência natural (e recomendável!) de qualquer atleta é recolher informação q.b. antes de uma prova em que vá participar pela primeira vez.
Entre os vários pontos em que é possível adquirir conhecimento, o site do evento costuma ser um deles. As redes sociais idem, e a própria leitura de artigos em blogs deste género também não costuma ser esquecida. Neste último exemplo, nota de destaque para maratonas e trails muito conhecidos.
Todavia, o aconselhamento junto de amigos que já tenham participado na corrida em questão costuma ser a fonte de maior influência. Na verdade, muitas vezes até são eles que nos puxam para novos eventos. Tal como puxaram muitos de nós para o mundo da corrida (fizeram muito bem!).
Acontece que os pareceres dos nossos amigos podem ser bastante enganadores. Isto por força de alguns fatores que vão influenciar seriamente a sua visão do evento. Uma perspetiva que nos vai ser passada e, quando chegar a nossa vez de participar, que pode afetar seriamente a nossa prestação. Seja de forma positiva, ou negativa.
A pergunta que se coloca é: que fatores são esses? Seguem-se os três que identifiquei, quando dei por mim a refletir neste assunto.
Fatores que influenciam as opiniões dos atletas sobre as provas de atletismo
1. A maneira como correu a prova
Se tiver corrido bem e conseguido uma boa marca, a probabilidade da pessoa em questão nos dizer que a prova é “boa de se fazer” é bem maior do que em caso contrário. As subidas parecem menos acentuadas. As descidas mais íngremes. Os percursos mais planos do que na realidade são.
Neste primeiro ponto, as caraterísticas do percurso têm muita influência. Aqui entra a prova de Estarreja que está na origem deste artigo. Passo a explicar.
Como quem não conhece é como quem não vê, quando a parte mais dura se encontra no final – altura em que, por norma, as energias já são poucas – o sofrimento é muito maior e a perceção de dureza potenciada. Inevitavelmente, isto deixa marcas psicológicas para o futuro. Salvo seja, quando sabemos o que nos espera e acondicionamos energias para esses momentos.
Por outro lado, se a prova for dura no início, altura em que ainda estamos frescos, uma má gestão não vai agravar a situação com tanta intensidade.
2. A vontade de repetir a prova e ter companhia
Os casos em que estamos em dúvida sobre uma prova, ou em que os nossos amigos assumem a iniciativa de puxar por nós para determinado evento.
Ora se alguém nos está a tentar convencer a ir, o mais natural é diminuir o mais possível as dificuldades do percurso e exagerar em tudo o que for positivo. Casos em que a opinião transmitida é conscientemente adulterada.
À partida, será sempre por uma boa causa e não haverá problema algum. Por outro lado, se for um desafio bastante exigente, para a qual a pessoa possa não estar física e/ou psicologicamente preparada, aí pode surgir uma situação problemática.
3. A sobrevalorização da prestação
Situações em que a pessoa que dá opinião está mais focada em si e na prestação que teve na dita prova, do que propriamente preocupada com a responsabilidade e importância do seu feedback para a outra pessoa. Acredito que este possa ser um comportamento consciente ou inconsciente.
Nestes exemplos, o mais importante para o “atleta-transmissor” é o quão magnífica foi a sua prestação. Um tempo fantástico para um percurso terrível. Subidas piores que as da Serra da Estrela. Uma ventania tremenda. Um calor abrasador. Por vezes é mesmo assim. Outras vezes, nem por sombras.
Andamos a ser enganados por aqueles a quem pedimos feedback?
De volta à pergunta, a resposta pode variar muito. Tudo depende do fator em que se insira. Se em certas alturas a opinião fornecida pode ser um resultado inconsciente da prestação da pessoa, noutros casos pode ter ponta de interesse.
Conclusão
Prova nova? Aconselhem-se sempre com mais do que uma pessoa. Recolham toda a informação possível e, no final, “juntem as peças todas” e tirem as vossas próprias conclusões.
Ah, e não se esqueçam de deixar sempre algumas energias de lado para possíveis imprevistos na segunda metade da prova. Se for um percurso de ida e volta, sensivelmente a meio já sabem o que vos espera. Em caso contrário, nunca se sabe que surpresas (desagradáveis) vos podem bater à porta.
E lembrem-se! Estamos sempre dos dois lados da moeda. Se um dia nos sentimos mal aconselhados, no outro podemos ser nós a ludibriar os nossos amigos. Como foi dito em cima, em alguns casos não é por mal. Trata-se simplesmente da nossa opinião, influenciada pela nossa gestão e experiência adquirida em competição.
Boas Corridas 🙂
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