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O Infinito Num Junco - Irene Vallejo

O Infinito num Junco – Irene Vallejo

Um livro sobre a história do livro. Em termos simples, assim se pode resumir esta obra da autoria de Irene Vallejo. Em mais detalhe, fica mais complicado defini-lo, porque, apesar do grande foco na história de Alexandria, da Grécia e do Império Romano, esta é uma viagem que toca em diversos assuntos importantes, quer no panorama actual, quer nos interstícios dos tempos e das Eras que, de forma rotativa, parecem repetições umas das outras, causando a impressão que não aprendemos nada com o passado. Não é bem assim, mas também não é totalmente mentira.

Adiante. Quando peguei nesta obra, foi porque esperava dela uma abordagem ao interesse do Ser Humano pelas histórias. Por muito estranho que pareça dizê-lo, e sendo eu, de momento, um ávido leitor, não consigo explicar muito bem o que me faz ler tanto, em troca com outro tipo de entretenimento. Isto é, não consigo pôr em palavras esta minha sede de leitura, que me confinou durante a adolescência, depois desapareceu por completo durante uma década (ou perto disso), e, mais recentemente, voltou a atacar-me. Para lá da sede de conhecimento – que não pode explicar tudo, pois há outros meios de entretenimento que também oferecem isso, ao mesmo tempo que entretêm -, não sei expressar o que me agarra tanto aos livros e, de alguma forma, procurava respostas sobre isso em “O Infinito num Junco”. Não apenas no papel de leitor, mas também enquanto escritor esporádico de textos. E não sendo eu um caso raro, contava com este livro para me dar a resposta “mágica” sobre o fascínio pelo mundo das histórias.

Ora, não foi isso que aqui encontrei. Ou talvez o meu subconsciente ainda não tenha reflectivo o suficiente sobre o assunto (já lá vai algum tempo), após esta viagem, ao ponto de dizer “Eureka”. (A escrita deste texto também visa ajudar-me a encontrar essa resposta). Certo é que esta leitura acabou por conduzir a minha atenção para outros assuntos. O “Infinito num Junco” relata, sobretudo, como o livro começou a ganhar forma, ainda antes de ser o objecto portátil em papel que é hoje. Bem como o aparecimento das bibliotecas. Esses lugares mágicos, alicerçados na necessidade de proteger (dentro do possível) as ideias, as histórias, e as memórias daqueles que vão passando por este mundo e deixam a sua marca, de alguma forma. Pelo meio, ficaram os anos de ouro da oralidade, que hoje passa muito despercebida. Antes da leitura em silêncio e individual, havia a leitura pública e em voz alta (declamações), o que era também uma maneira de aproximar académicos e analfabetos, pois a incapacidade de ler, nos tempos antigos, era a “normalidade”.

Apesar de toda esta história ser interessante, e apresentar conhecimentos relevantes para o leitor entender melhor as civilizações grega e romana, confesso que tal assunto, tendo em conta as minhas expectativas e esperanças depositadas neste livro, não seria suficiente para lê-la até ao fim. Felizmente, e talvez seja isso que tenha exacerbado a projecção do livro, esta obra é uma viagem recorrente no tempo. Juntando todas as palavras da autora, o salto temporal predominante dista em mais de de 20 séculos, e surge não apenas para estabelecer uma ligação entre o presente e o passado longínquo, mas também para Irene Vallejo enquadrar a sua própria realidade. Que, arrisco dizer, em muitos contextos também será a do leitor contemporâneo. E, sem surpresa, no que diz respeito à sua ligação pessoal e específica com os livros, encontrei vários pontos de interesse, com a mesma facilidade com que dois ávidos leitores entabulam conversa, logo após se conhecerem.

Posto isto, se estes saltos no tempo se ficassem pelo foro pessoal, estou em crer que já não largaria o livro. Porém, uma vez que as nossas vidas estão directamente ligadas à sociedade em que vivemos, a autora aproveitou o embalo para tocar em pontos que marcam a actualidade de uma forma mais generalizada, conseguindo, a meu ver, atribuir mais temáticas apelativas à sua obra. Numa escrita minimamente acessível e, sobretudo, cativante, os temas do patriacardo, da censura, e da tecnologia (entre outros) são abordados com relativa frequência. Regra geral, de uma maneira imparcial. Todavia, em algumas circunstâncias, com algumas “alfinetadas” que, é minha perspectiva, num tom apropriado.

Entre os temas da actualidade já mencionados, destaque para a mulher e para os escravos dos tempos antigos, e de como a primeira, apesar de todas as dificuldades, conseguiu, em raros casos, sobrepor-se a todas as dificuldades impostas por uma civilização dominada pelo homem. Sobre a tecnologia, há uma curiosa abordagem sobre como o que é novo tem tendência a desaparecer mais depressa do que o mais antigo, ao contrário do que tantas vezes pensamos. E o livro é um óptimo exemplo, tendo em conta que há muito tempo se diz ter os dias contados. Relativamente à censura, há demasiados pontos de interesse. Um deles é o que divide a censura imposta por outrém da auto-censura. Esta última, referente aos medos interiores que tantas vezes nos impedem de actuar e fazer o que achamos que deve ser feito. Outro aspecto igualmente apelativo, e com isto me despeço, diz respeito à importância do livro para pôr a nossa cabeça a pensar por ela própria (e aqui pode estar mais uma peça do puzzle que responde ao meu fascínio pelos livros), por vida daquilo que já foi escrito e do seu contexto de época. Nada melhor que pegar nas palavras da autora para o manifestar:

 

Sentir um certo incómodo faz parte da experiência de ler um livro; há muito mais pedagogia na inquietação do que no alívio. Podemos mandar para o bloco operatório toda a literatura do passado para submetê-la a uma cirurgia estética, mas então deixará de nos explicar o mundo (…)

 

Nota: O autor escreve de acordo com o antigo Acordo Ortográfico.

 

Ligado ao desporto desde pequeno, deixei definitivamente o futebol em 2016 para me dedicar afincadamente ao atletismo. Desde aí que muita coisa mudou na minha vida, a qual não imagino sem o desporto.

O Vida de Maratonista nasce então da minha paixão pelo atletismo, com contribuição especial da minha Licenciatura em Engenharia Informática, que me permitiu criar a solo este espaço de aventura e opinião, e torná-lo agradável a quem o visita.

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