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Corrida São Pedro 2024

Corrida de São Pedro 2024: Quem queremos ouvir?

Como por aqui tenho dado a entender, por regra, treino e compito pelas sensações e indicações que recebo do corpo e da mente, e não tanto pelo relógio. Especialmente em competição, são poucas as corridas onde consulto o relógio, embora os dados me sejam úteis no pós-prova para análise. Por outras palavras, a minha parte psicológica e física são as minhas conselheiras mais regulares, no que ao atletismo diz respeito.

Ora, apesar dessa confiança individual nas minhas análises e avaliações, não quer isso dizer que por vezes não chegue à conclusão que seja melhor, dadas as circunstâncias, escutar outras pessoas (ou, no caso de ontem, equipamentos tecnológicos) e seguir essas indicações em vez das minhas. Pelo menos, ter a convicção que esse é o melhor caminho. E foi assim que, este domingo, em mais uma edição da Corrida de S. Pedro (2024), fiz a prova com base nos dados apresentados em tempo real pelo meu relógio, ao invés das minhas sensações. Ambicionava um registo de 31 minutos e 59 segundos, pois trazia boas indicações dos treinos das últimas semanas (embora insuficientes para não ter dúvidas quanto a essa minha capacidade no momento actual) e, depois da marca na casa dos 32 minutos em 2023, este era o passo seguinte. Não se concretizou, ficando em aberto se numa manhã com menos vento tal fosse possível, ou pelo menos melhorar a marca actual.

Adiante, e como vos ia contar, tomar esta decisão representou maior confiança na máquina do que em mim para chegar ao melhor desempenho possível. E este seguir o relógio, ainda que mais em “tempo real”, pode ser equiparado a seguir um treinador que nos diga que temos de “atacar” a prova a X ritmo, ou seguir o ritmo pautado por uma “lebre” que nos é atribuída, aconteça o que acontecer. Resumindo, é uma escolha, que pode ter melhores ou piores resultados. Mas há ainda uma terceira categoria, talvez até menos pré-programada, e que pode colocar em segundo plano as opções supra referidas: o regularmos o nosso esforço pela prestação de outros atletas com quem estamos habituados a competir e que, em plena prova, consoante estejam adiantados, atrasados, ou no mesmo grupo que nós, coloquem o nosso desempenho e variação de ritmos dependentes daquilo que eles estejam a fazer e não tanto das nossas capacidades no momento.

Em suma, há um leque muito vasto de conselhos e abordagens (de facto, mesmo dentro destas categorias, poder-se-ia expandir isto um pouco mais) do qual podemos fazer apenas uma escolha, um misto de várias, ou até começar por uma e depois “remendar” ou alterar a estratégia durante a prova, pois em plena corrida há sempre peripécias não programadas que se juntam a toda esta conversa.

De volta à minha corrida na Póvoa de Varzim, não me arrependo da decisão tomada, apesar da sua estranheza no meu dia-a-dia e desta me ter deixado muito pouco confortável. Entendi que era a melhor abordagem para tentar, no mínimo, actualizar o meu recorde pessoal, que também ficou adiado. Contudo, continuo a pensar que foi uma decisão (e pegando num termo algo conhecido) “boa o suficiente” e não me arrependo de a ter tomado. Isto porque olhar para vários quilómetros a 3:12/Km e 3:13/Km, depois de um quilómetro inicial louco (mas previsto!), é transformar estes números num hábito conjunto de treinos e provas. O que se traduz em ganhar algum à-vontade, para futuro, com esta gente vizinha dos 3:10/Km. Como disse, tinha algumas reticências sobre a possibilidade de, este domingo, entrar na casa dos 31 minutos. Estive lá na primeira metade da prova, toquei à campainha, só que sem resposta. No entanto, quem sabe se na próxima tentativa, depois de mais algum tempo a conhecer ali melhor os vizinhos, a porta se abra. Não saí da Póvoa com um RP, mas mais confiante no trabalho desenvolvido e na minha capacidade de decisão, ainda que, ironicamente, tenha decidido confiar numa máquina e não no meu instinto. Como já sugeri, poderia também ter sido num treinador, ou em alguém que me convencesse (e aqui o termo utilizado é importante!) que eu estava capaz de correr ao ritmo ambicionado. Estou a dizer isto e, derivado da escolha que fiz, nunca vou saber se o resultado seria melhor se tivesse optado por correr pelas sensações, como habitualmente. Todavia, sei que o “arriscar” de ontem tirou-me da zona de conforto desde o tiro de partida e deixou-me perceber, cortada a meta, que a quebra na segunda metade não foi assim tão significativa, revelando capacidade de minimizar perdas depois da ousadia, de sustentação do esforço, e de que não estou assim tão longe do que pretendo para o futuro próximo aos 10K. Repetindo: foi uma decisão “boa o suficiente”, preenchida por ilações positivas e relevantes.

A terminar, dizer que olho para esta aventura como um espelho daquilo que vai sendo o acumular da minha experiência nestas andanças. Isto é, que com o passar do tempo e o acumular de aventuras torna-se mais fácil “cavar um fosso” entre o número de boas e más decisões tomadas, em favor das primeiras. Pois a capacidade para ajuizar, em cada situação, quem me vai dar bons conselhos ou indicações, fica mais apurada a cada dia. O que, devo referir, também é tranquilizador para a minha consciência, tornando-me inclusive menos impaciente na procura de resultados e mais consistente no método de trabalho.

Boas Corridas!

 

Nota: O autor escreve de acordo com o antigo Acordo Ortográfico.

Foto: Fernando Ramos Fotografia

 

Ligado ao desporto desde pequeno, deixei definitivamente o futebol em 2016 para me dedicar afincadamente ao atletismo. Desde aí que muita coisa mudou na minha vida, a qual não imagino sem o desporto.

O Vida de Maratonista nasce então da minha paixão pelo atletismo, com contribuição especial da minha Licenciatura em Engenharia Informática, que me permitiu criar a solo este espaço de aventura e opinião, e torná-lo agradável a quem o visita.

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