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Homem Mulher Atletismo Desporto

O Homem, a Mulher, o Atletismo e o Desporto

Numa altura em que a desigualdade social entre Homem e Mulher tem sido tema de conversa regular, de certa forma impelido pelos vários casos de violência doméstica que têm sido reportados, eis que dei por mim a refletir sobre o assunto no panorama do atletismo (qual mais poderia ser?).

Uma meditação que (confesso!) não precisou de ser muito profunda para me colocar à frente dois assuntos:

  • A diferença nas distâncias de algumas provas que para mulheres são mais curtas do que para os homens. Temos o exemplo de alguns corta-matos, mas os casos mais em voga serão os da marcha, pelos quais Inês Henriques tem lutado afincadamente e sido bem sucedida. Um assunto que não será falado neste artigo.
  • A diferença dos prémios monetários entre homens e mulheres na mesma prova. Um assunto a ser abordado já de seguida e que irá desaguar a outros assuntos, a meu ver, no mínimo curiosos.

 

A diferença dos prémios monetários entre homens e mulheres

Antes de mais, notem que aqui não estou a apontar diferenças de valores para a mesma classificação em ambos os géneros. Na verdade, ceio que isso raramente acontece. O que trago para debate é sim o encurtamento da tabela de premiados entre os dois lados que tantas vezes se verifica, especialmente nos escalões de veteranos.

De facto, não são assim tão poucas as provas que para os Veteranos Masculinos criam escalões de 5 em 5 anos e para as Veteranas Femininas criam escalões de 10 em 10 anos, ou até mais! Uma decisão que levanta muitas vezes insatisfação, causa estranheza, e, inevitavelmente, aparenta ser um caso óbvio de desigualdade.

Todavia, este poderá ser um tema muito discutível. Para isso, basta analisá-lo do ponto de vista do “dar e receber” por igual. Será de todo injusto a organização de uma prova premiar mais atletas masculinos do que femininos, se o rácio de participação por género for de 75:25 (%), ou até superior? Desta perspetiva, não me parece uma decisão descabida, ou até injusta.

Quando se anda no terreno, consegue-se perceber esta discrepância entre géneros na aderência aos eventos. Assim como se nota a diferença de quando se trata de uma prova comercial ou federada. No entanto, porque por vezes podemos ser iludidos, decidi ir à procura de números mais exatos. Como tal, fiz uma seleção de 10 provas em que participei nos últimos anos (5 federadas e 5 comerciais), analisei os resultados e calculei a % de participação dos dois géneros. A tabela que se segue mostra os resultados obtidos.

 

ProvaTipoParticipação
Feminina
Participação
Masculina
Corrida EDP Espinho 2018Comercial23.7%76.3%
S. Silvestre Espinho 2019Comercial21.5%78.5%
5ª Corrida da República (Rio Tinto - 2018)Comercial21%79%
33º GP Atletismo Cidade de Estarreja (2018)Federada20.8%79.2%
Corrida S. João do Porto 2018 (V. N. de Gaia)Comercial19%81%
5ª Corrida Fernanda Ribeiro (Maia - 2018)Comercial17.3%82.7%
4ª Corrida S. Tiago (Rio Meão - 2018)Federada16%84%
33ª Meia Maratona de Cortegaça (Ovar - 2017)Federada13.1%86.9%
19º GP Atletismo Vila de Mozelos (2018)Federada12.5%87.5%
28º GP Atletismo S. Paio de Oleiros (2016)Federada11.1%88.9%

 

A que se deve esta diferença de participação entre géneros?

É por esta altura que faço a pergunta: então mas porque existe este desequilíbrio tão grande entre géneros na prática do atletismo? A resposta certa a esta questão poderá ser muito importante para descobrirmos se tal diferenciação é resultante de práticas e mentalidades que se impregnaram nas sociedades dos tempos que correm, ou se esta desigualdade se deve à essência do homem e da mulher. Isto é, às caraterísticas intrínsecas de cada um e que os tornam diferentes para além do aspeto físico. Neste lote de diferenças, temos a competitividade em evidência, já de seguida.

 

No desporto, o homem é mais competitivo do que a mulher?!

Sim! Pelo menos é esta a conclusão a que chega um estudo de 2015, intitulado “Sex Differences in Sports Interest and Motivation: An Evolutionary Perspective, conduzido por Robert O Deaner, Michael P. Lombardo e Shea Michael Balish, publicado no jornal Evolutionary Behavioral Sciences.

No que toca ao esforço físico, o homem tem muito a tendência de mostrar que é melhor que os seus rivais Uma espécie de galos que querem mostrar quem manda na capoeira, daí um maior interesse e atração pela vertente competitiva.

Claro está que um estudo deste tipo pode ser altamente condicionado, dependendo de onde for realizado. Para além de que alguns desportos não estão ao alcance de todos devido ás suas exigências económicas. Porém, como o próprio estudo faz menção, o atletismo neste aspeto será dos mais isentos, pois o investimento necessário é diminuto.

De volta à competição no panorama do atletismo, a distinção de provas federadas e comerciais na tabela apresentada em cima encaixa muito bem neste tema. Certamente repararam que a % de participação das mulheres nas provas comerciais é quase sempre maior que em provas federadas. Porque será?

Ora, enquanto as provas federadas são quase exclusivamente competitivas, nas comerciais a maior parte do pelotão não é federado. Isto não significa que não estejam lá participantes por causa da competição. Quer apenas dizer que existe uma boa parte que não se encontra ali para alcançar um bom lugar ou uma boa marca, mas a dar primazia à vertente lúdica.

Pois bem, o estudo supracitado fala nisto. Ao que parece, a mulher tende a ver o desporto como forma de se manter ativa e em forma no seu dia-a-dia, consequente bem estar, e a inevitável satisfação de superar cada desafio, não dando tanta importância à parte competitiva. Será por acaso que o pilates e o yoga são as preferências de muitas mulheres em prol de outras opções físico-desportivas? Ou será pelas ilações apontadas neste parágrafo?

Querem outro facto curioso deste mesmo estudo? Aqui vai ele! Os homens são três vezes (3x) mais susceptíveis de levarem um empeno valente a meio de uma corrida do que a mulher. Uma estatística associada ao ímpeto competitivo desportivo do homem, que tantas vezes se deixa dominar por este impulso. Se o homem fosse capaz de controlar esta sua adrenalina, não correria tanto este risco de ficar aquém do seu “real valor cronométrico”.

 

Há mais homens do que mulheres interessados em desporto?

Mesmo que seja verdade a questão do homem ser genuinamente mais competitivo (em termos desportivos!) do que a mulher, isto não pode servir como única justificação para se dizer que existem mais homens interessados em desporto do que mulheres.

Na minha opinião, aqui sim, será de extrema importância perceber se algo está a provocar este condicionamento. O estudo “Sex Differences in Sports Interest and Motivation: An Evolutionary Perspective” também incide um pouco sobre este tema – o interesse do homem e da mulher pelo desporto enquanto espectadores – e refere alguns aspetos interessantes, aos quais eu tomei a liberdade de juntar os meus.

 

Será a parte competitiva a principal causa para esta diferença?

Não me parece. Uma coisa é a prática, outra é a supervisão e o acompanhamento. Um exemplo muito claro disto são as grandes provas de ciclismo. Como alguns comentadores dessas provas muitas vezes referem, alguns espectadores dessas provas apontam as paisagens por onde as etapas passam como um dos principais motivos para o seu visionamento. Como é fácil de entender, esta razão não tem nada de espírito competitivo.

 

A mulher prefere usar o seu tempo livre noutras atividades?

Uma boa possibilidade. Uma questão de dar prioridade à maior preferência. Eu posso gostar muito de ver um filme, ler um livro ou jogar um jogo. Mas se entre os três só poder fazer uma escolha … vou dar uma corrida! O tempo não dá para tudo.

 

A maior parte das transmissões desportivas são masculinas!

É um facto! Com muita ironia! Numa altura em que os media, nomeadamente os canais televisivos, muito têm divulgado estudos que apontam para as desigualdades entre o Homem e a Mulher na nossa sociedade, a verdade é que em termos prático-desportivos, que é onde se insere este meu artigo de opinião, nada têm feito.

Passo a explicar. Os desportos que passam nos canais televisivos são maioritariamente masculinos. Por outras palavras, quantos jogos de futebol masculino têm de passar para se transmitir um feminino? Nos restantes desportos ainda será pior!

Mas o mais grave é a projeção! Em alguns jogos de futebol, o acompanhamento que é feito antes do jogo é por demais. Só falta verem os jogadores a dormir e a irem à casa de banho. No panorama feminino, ainda há pouco tempo se disputou o 1º Campeonato Europeu de Futsal, que até se realizou em Portugal, onde a nossa seleção ficou em 2º lugar. Um evento que eu só tive conhecimento de estar a decorrer no dia da meia-final.

Noutros casos, por muito distraído que andasse, uma semana antes já sabia em que hotel os jogadores iam estagiar. Isto sim, parece-me uma grande desigualdade! Será por questões económicas? Não digo que não! Contudo, órgãos de comunicação com grande impacto e responsabilidade social não podem só pregar a mensagem e mandar os outros fazer. Há que dar o exemplo!

Ainda dentro deste tópico, caso existisse igualdade, será que as mulheres iam ver mais desporto por serem do mesmo sexo as atletas em cena? Não sei! Mas será que os homens iam ver menos desporto por a transmissão ser feminina em vez de masculina? Também não sei! Se calhar alguns até iam ver mais, se é que me faço entender …

 

Conclusão

Um artigo que começou na diferença dos prémios monetários no atletismo, mas que foi muito para além disso, embora sem apresentar uma resposta definitiva para as questões levantadas. Pessoalmente, e à semelhança de outros artigos meus anteriores, creio que isso não era o mais importante para este debate, mas sim ficar a matutar sobre estas questões.

Com o tema da igualdade entre o Homem e a Mulher tão em voga, por alguns motivos bem justificados, outros nem tanto a meu ver, achei interessante arrastá-lo para a questão desportiva, com especial incidência sobre o atletismo.

Deixando de lado princípios fundamentais de sobrevivência e bem-estar, cujas diferenças entre o Homem e a Mulher nunca deviam ter aparecido, a questão da competitividade desportiva levanta a dúvida sobre uma luta cega para sermos iguais em tudo, quando genuinamente somos diferentes em muitas coisas, encaramos as situações de diferentes maneiras e, no que toca a à construção de uma sociedade/comunidade feliz e coesa, sem dúvida que um dos géneros é mais apto e talentoso do que outro para determinadas coisas e vice-versa. Por isso é que se chamam “Homem” e “Mulher”. Palavras que não são sinónimos.

Despeço-me com a questão da gravidez no plano desportivo. Outro assunto que “dava pano para mangas”. Se a mulher dá à luz e o homem não, faz sentido haver igualdade no estatuto do homem e da mulher no panorama desportivo? Provavelmente não! A mulher deve ter algo que a proteja e lhe dê condições no caso de desejar ser mãe, em vez ter que adiar essa sua vontade indefinidamente para não correr o risco de perder o contrato profissional com a equipa que representa e assim usufruir desse direito que lhe é exclusivo. Para quem estiver interessado neste último tópico, eis um artigo interessante.

 

Imagem de Capa: Kristoffer Trolle

 

Ligado ao desporto desde pequeno, deixei definitivamente o futebol em 2016 para me dedicar afincadamente ao atletismo. Desde aí que muita coisa mudou na minha vida, a qual não imagino sem o desporto.

O Vida de Maratonista nasce então da minha paixão pelo atletismo, com contribuição especial da minha Licenciatura em Engenharia Informática, que me permitiu criar a solo este espaço de aventura e opinião, e torná-lo agradável a quem o visita.

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