skip to Main Content
Trilogia O Senhor Dos Anéis - Editorial Planeta

O Senhor dos Anéis: O que representa o Anel do Poder?

Três meses foi tempo mais que suficiente para conseguir ler, pela primeira vez, a aclamada trilogia de J. R. R. Tolkien, intitulada “O Senhor dos Anéis”. Uma história da qual me tornei fã quando apareceram as adaptações cinematográficas de Peter Jackson, ou seja, pouco depois da chegada do novo milénio. Porém, por essa altura, não me passava pela cabeça ler os livros. Só muitos anos mais tarde, já depois da leitura (em geral) ter ressurgido na minha vida e rotina diária, e com o primeiro volume “A Irmandade do Anel” a figurar na minha estante, lá me decidi a dar início a esta aventura. Foi a primeira vez (salvo erro), que vi uma adaptação cinematográfica desta dimensão antes de contactar com a obra original (livros), e, como era de esperar, a minha imaginação conjurou as personagens com o guarda-roupa e o aspecto com que estas se apresentaram nos filmes. Mas para lá desse molde criativo, tudo ok. Melhor do que ok! Não esperava ter feito esta leitura completa da trilogia em tão pouco tempo, pois conhecendo o desfecho da história e grande parte das aventuras, era expectável que me arrastasse um pouco na leitura.

O que não se verificou. E porquê? Ora bem, para lá de ter ficado encantado com a escrita de Tolkien, cujas descrições dos ambientes são de uma dimensão ao nível da demanda do anel que Frodo carrega, a verdade é que estas se lêem de uma forma fácil ou, pelo menos, fluída, na grande maioria das ocasiões. Quando as descrições não têm este tipo de características, torna-se maçador prosseguir e desespera-se pelas páginas com diálogos para se respirar um pouco. Contudo, para um leitor minimamente treinado, “O Senhor dos Anéis” tem um tom diferente, apaixonante, e que impressiona. Para mim, enquanto adepto de associações para explicar e descrever situações, ler estes três volumes foi como entrar no paraíso das comparações, dos paralelismos e das metáforas: estão por toda a parte, mas sem que daí advenha aquela sensação de desgaste e repetição tantas vezes inevitáveis, é uma coisa impressionante!

No entanto, não é a única, pois há uma forte concorrência dos diálogos elaborados pelo autor, independentemente da criatura que lhe dê voz (feiticeiros, elfos, humanos, anões, ou hobbits: a dita “gente pequena”). Chovem palavras e observações sábias por todo o lado, de acordo com as origens e culturas de cada raça. Se nas adaptações visuais, e sendo mais jovem, aguardava os momentos de acção com ansiedade e entusiasmo, nos livros, esses ficaram claramente para um plano mais secundário. Os diálogos e as descrições empregues por Tolkien são, de facto, de outro planeta. De outros tempos. Dos tempos da Terra Média.

Adiante. Perdido entre descrições e conversas das personagens principais de cada livro da saga, era minha intenção, no final da trilogia, fazer uma análise mais profunda da história. Isto é, tirar algum sentido dela, nomeadamente, do enigma em torno do Anel do Poder, que pode ser sujeito a várias interpretações. Contudo, o périplo de Frodo e Sam trouxe-me uma dessas perspectivas (a minha enquanto leitor) ainda antes de eu me debruçar sobre o assunto. Acabou por acontecer mais cedo do que o esperado, sem que eu o pudesse impedir (sabiam que este é um dos poderes dos livros?!).

O momento eureka atingiu-me quando os dois hobbits estavam já perto do Monte da Condenação. Em concreto, quando Samwise Gamgee carrega o objecto em lugar de Frodo e sente toda a pressão do Anel. É mais uma descrição soberba de Tolkien, onde também sobressai a sensatez dos hobbits. À boleia de tudo isto, esta passagem em específico apresentou-me o Anel do Poder a uma luz diferente: vi-o como o símbolo daquilo que Steven Pressfield apelida de “ Resistência”, mas que terá outros termos na língua de outros autores e pensadores. Repito: a Resistência. Dito de forma mais elaborada, aquela barreira que todos os dias se atravessa no nosso caminho e que, afectando uns mais do que outros, exige de nós mais ou menos esforço (consoante as situações) para a derrubar e, assim, fazer aquilo que sentimos que devemos fazer com a nossa vida.

Dito isto, “basta” ultrapassar esta Resistência em algumas ocasiões para percebermos a satisfação – se nos dermos também ao trabalho de a saborear – que nos espera do lado de lá desta barreira. (E aqui não misturo satisfação com o termo “felicidade”, pois não sei se será bem a mesma coisa.) Acontece que cada dia da nossa vida pode ser um verdadeiro mistério e não propriamente uma sequela ou uma repetição do anterior. Acontecimentos agradáveis e desagradáveis, bem como uma multiplicidade de tentações, fazem-nos as suas visitas quando menos esperamos e, no que toca a estas últimas, e por mais vezes que tenhamos experienciado ou acumulado vitórias diárias perante a Resistência, nunca teremos a garantia que a voltaremos a vencer, seja um tipo de resistência já conhecida, seja uma nova, ou até uma versão mais evoluída de alguma previamente superada. A única certeza é que a dita cuja nunca pode ser vergada de forma definitiva. Não obstante a guerra perdida logo à partida, podemos ganhar experiência em cada confronto (que nos pode vir a ser útil nos seguintes), e ainda, por via desta história, prepararmo-nos melhor para o mistério que é o nosso futuro, ao tomar conhecimento de algumas variáveis que podemos inflacionar ou mitigar, consoante os casos, para tentar ganhar vantagem em cada combate. Situações essas que identifiquei nesta obra-prima de Tolkien, acima de tudo por via da diversidade de personagens relevantes e das suas demandas.

A primeira tem que ver com o conhecimento e a complexidade da nossa vida. De forma concreta, só podemos desejar e ambicionar aquilo que temos conhecimento. E logo aí há uma grande diferença entre os hobbits e as restantes raças. Enquanto a gente pequena há muito que vive numa rotina de ciclo fechado, pois por mais gerações que passem, ela não muda nem evolui, com o Homem e os restantes povos há conhecimento a desflorar, (sede de) poder a aumentar, e riquezas a desenterrar de poços sem fundo (minas). Assim, enquanto uns (hobbits) vivem numa espécie de liberdade limitadora e não desejam mais do que isso, os outros são tentados diariamente pela ambição que os entranhou e que não baixa a aguarda.

Dito de outro modo, quanto mais possibilidades e mais conhecimento, mais dilemas, cenários hipotéticos, responsabilidades, e tentações se nos deparam por arrasto. E, chegado a este ponto, parece-me oportuno inserir aqui a vertente racial, cultural e hereditária deste universo ficcional e do mundo real. Seria bom (ou não?) se esta questão da ambição e do desejo “morresse” a cada geração? Não parece ser o caso. Aquilo que se passa à nossa volta (na nossa aldeia, cidade, e sociedade), juntamente com o que advém das gerações anteriores da nossa família (e das que nos acompanham), permite, regra geral, a continuidade das mentalidades e perspectivas de vida cultivadas ao longo dos anos, no sítio em causa, até surgir algum acontecimento histórico impactante. No contexto de “O Senhor dos Anéis”, fica a ideia que o Mal sabe disso. Sauron sabia disso, quando decidiu corromper as raças que mais temia, ao entregar-lhes Anéis de Poder ao mesmo tempo que, pelas costas, forjava o seu Anel Dominador. Essa corrupção foi passando de geração em geração, e uma das demonstrações mais claras desse efeito foi quando Isildur decidiu ficar com o Anel do Poder em vez de o destruir. Essa decisão não só deixou clara a fragilidade humana como reforçou essa sede de poder que possivelmente já vinha agarrada ao ADN do Homem. Não que seja impossível contrariar esta vontade, como já assistimos em situações à nossa volta e, no caso desta obra, como demonstra a dicotomia Aragorn-Boromir, ou, talvez melhor ainda, a reacção dos irmãos Faramir-Boromir (muito mal representada nos filmes de Peter Jackson) quando frente-a-frente com o Anel do Poder. Agora, que é exigido um esforço muito maior para lhe fazer frente (a essa grande tentação, essa enorme Resistência), isso parece óbvio.

Já num canto remoto da Terra Média, fechados na sua simplicidade, alguém ficou de fora desta corrupção “passiva” de Sauron. Alguém escapou ao seu olho maléfico: os hobbits, que foram os únicos a não receber anéis. Isto permite-me saltar do plano geracional-cultural para o cultural-ambiental, que acaba por ir desaguar à questão da acessibilidade. Afinal de contas, o potencial de complexidade da nossa vida depende, alicerçada tantas vezes nas nossas raízes culturais e ambientais, da nossa facilidade em adquirir novos conhecimentos e contactar com novas realidades. Vejamos. Os elfos, os homens, e os anões (os feiticeiros continuam de lado neste texto, mas a eles chegarei) sempre sentiram que o nível seguinte de riqueza, poder e sabedoria estava ao seu alcance. Já os hobbits estavam limitados ao seu precioso Shire e desinteressados no que se passava para lá dos seus quatrins. E no caso da gente pequena, esta condição, inadvertidamente, era a primeira grande força de oposição à Resistência. Assim sendo, tanto no mapa regional do Shire como nas suas cabeças, a simplicidade, que me parece ser a marca mais vincada dos hobbits, protegia-os das tentações mais invasivas, dentro da já referida liberdade limitadora, ao passo que as restantes viviam e pensavam sem conhecer fronteiras. Foi com Sam e o Anel do Poder que comecei este texto, embora seja Frodo que o carrega quase o tempo todo. E lá está, fora do seu ambiente natural (Shire), e com o Anel ao pescoço, sempre ali tão perto e acessível, muitas vezes o corajoso hobbit é tentado a colocá-lo no dedo e a ceder ao Poder (à Resistência), da mesma forma que nós hoje em dia estamos a um clique ou toque de abrir o browser da internet no computador ou no telemóvel e perdermo-nos nesse universo sem fim, relegando para segundo plano o que devíamos estar a fazer. Quem sai vitoriosa? A Resistência.

Em suma, a gente pequena vive num mundo em que todos procuram o mesmo e que não foge das fronteiras (se é por comodismo, conforto, ou por decisão própria, eis uma bela questão). Por seu lado, os restantes povos vêem os seus companheiros crescer, ou ficar mais poderosos, não conseguindo ficar indiferentes a isso, e ali se instala a competição pelo poder e pela fama. Até aqui, este texto parece sugerir que os hobbits são os (únicos) grandes heróis e modelo que devemos seguir. Que todas as outras raças são isentas de virtudes, ao ponto de as poder juntar todas no mesmo saco onde se encontra Sauron e todo o mal que este representa. Não é bem assim, como a parte seguinte deste artigo deixará claro. Ou melhor, a simplicidade e os Hobbits continuarão a ser os grandes protagonistas, o melhor de toda esta história quando toca a falar da Resistência, a meu ver. No entanto, a intervenção das restantes raças em “O Senhor dos Anéis” foi crucial para que a jornada de Frodo e Sam tivesse sucesso e, quanto a nós, pode ter um papel preponderante em determinados confrontos que possamos travar com a Resistência, ao longo das nossas vidas. De mais a mais, não é certo que, por mais que seja nossa vontade, queiramos “vestir” o papel dos hobbits a cada dia da nossa aventura pessoal. Podemos muito bem nos encontrar no papel dos restantes – até no lugar do Anel do Poder, enquanto forças de Resistência em que nos transformamos para, fruto da inveja e da maldade, ou até inconscientemente, dificultarmos as demandas daqueles que nos rodeiam.

Tudo isto me leva à Irmandade do Anel, fundada em Rivendell. Composta por nove companheiros, ao lado dos quatro hobbits e de Gandalf (o feiticeiro) seguem guerreiros que representam todos os povos principais (e considerados “bons”) deste universo. Os mesmos povos que Sauron corrompeu com os seus anéis. No Concílio em que tem origem a Irmandade, é evidente que todos eles reconhecem os efeitos do Anel do Poder e o que este pode desencadear, para o bem ou para o mal, ao ponto de não confiarem uns nos outros para transportarem o Anel. Mais uma vez, livres de anéis nos seus currículos, não há argumentos que possam ser usados contra os hobbits transportarem o anel. Pois nem Gandalf se atreve a transportá-lo, com medo do que lhe possa acontecer se o usar.

E o feiticeiro merece muito mais do que uma palavra neste assunto. Ausente ou junto dos seus companheiros, Gandalf é para mim o verdadeiro mentor. Aquele que reconhece não ter o poder para fazer o que tem de ser feito, mas que sabe como fazê-lo e como criar condições para isso, encontrando as pessoas certas, ou estas a ele. Transpondo para a nossa realidade, é uma daquelas pessoas que, quando singramos na vida e olhamos para trás, percebemos que nos deu as condições para chegarmos onde chegamos; que nos mostrou o caminho, pois tinha a sabedoria na ponta da língua; e, destas formas e mais alguma, nos ajudou a superar as adversidades que não seriamos capazes de ultrapassar sozinhos.

Em jeito de aparte, o feiticeiro é o maior exemplo que encontro para a minha vida nesta altura, seja para o presente, mas sobretudo para o futuro, à medida que fico mais velho. Adoro absorver novos conhecimentos e Gandalf é dotado de uma grande sabedoria. Contudo, mais importante do que isso, invejo-lhe a humildade, depois de ter conquistado tanta coisa na vida e ter feito mais pela Terra Média do que quase todos os seus habitantes. É um grande líder quando tem que o ser, e alguém que sabe assumir um papel secundário quando sente que essa é a sua posição. E foram esses dois papéis que envergou quando se juntou à Irmandade. Não transportou o Anel, mas fez uso do seu conhecimento da Terra Média, do próprio Anel, e do Inimigo, para orientar e conduzir os seus companheiros pelos caminhos que lhe pareciam mais seguros e sensatos. Aliás, a sua morte e ressuscitar (porque foi quase isto que aconteceu) pode perfeitamente simbolizar essa infinitude, essa marca indelével que pessoas como ele deixam nas nossas vidas. Porque mesmo quando a sua presença deixa de ser física, os seus ensinamentos e conselhos já não podem ser arrancados do nosso espírito e consciência.

Sozinhos ou em grupo, é nossa responsabilidade, para connosco e para benefício do bem-comum, enfrentar e procurar superar a Resistência. Caso contrário, se cedermos ao comodismo, facilitismo e procrastinação, estamos apenas a permitir, dia após dia, que Sauron se torne mais forte, e que o Anel que transportamos fique mais pesado. Por outras palavras, começamos a ceder ao Anel do Poder, e em vez de fazermos a jornada diária até Mordor, o mais provável é acabarmos a enveredar por outros caminhos, ainda mais tenebrosos. “O Senhor dos Anéis”, como não poderia deixar de ser, ilustra alguns exemplos.

O primeiro é acabar na errância e no isolamento, e aguardar a chegada de uma morte trágica. É este o caso e o desfecho de Saruman, o oposto de Gandalf, que acaba por enveredar pelo caminho mais fácil e, ao mesmo tempo, ambicioso. Ou seja, Saruman não é propriamente um caso exclusivo de cedência à Resistência. Um caso de enfrentá-la ou ceder ao seu poder. Aqui há uma outra força a tentar ser dominante: a ambição. O que Saruman tenta fazer é usurpar Sauron e a Resistência. Ele quer tomar o seu lugar, quer sentir a subjugação de todos os que o rodeiam ao seu poder. Mas fracassa, e então recusa-se a aceitar uma outra condição que não aquela que desejava. Como resultado, Saruman acaba por se tornar numa fonte de azedume e amargura, substâncias que descarrega para cima de qualquer criatura que ainda arrisque aproximar-se dele e estabelecer contacto. O (outrora) “feiticeiro branco”, de alguma forma, é aquilo em que Gandalf tinha medo de se tornar, caso entrasse em contacto com o Anel do Poder: um verdadeiro louco! Talvez por isso, Gandalf demonstre tanta compaixão por ele no final. Já de outra perspectiva, esta loucura, a par dos poderes que lhes são reconhecidos, pode justificar o porquê dos anéis de Sauron não terem chegado aos feiticeiros. Porque corromper os fracos e os fortes, os mais ou menos inteligentes, e assim subjugá-los, é relativamente acessível quando se tem poder. O mesmo não se pode dizer dos loucos e dos estúpidos, os quais ninguém é capaz de controlar: são demasiado imprevisíveis, como aqui ficou demonstrado.

A segunda possibilidade é perdermo-nos dentro de nós próprios. De deixarmos de nos reconhecer. De não sermos mais capazes de distinguir o que está associado à nossa simplicidade e integridade, e o que está agarrado a nós, entranhado na pele e nas profundezas do couro cabeludo, que nos torna servos da vontade do caminho mais fácil. Assim foi com Gollum, que acabou com um dupla-personalidade, perdido nessa luta interior e para lá de um desejável ponto de retorno.

Por fim, existe a hipótese de encontrarmos uma queda à altura da nossa ascensão, quando absortos no poder, no egoísmo, facilitismo, e nas escolhas tomadas exclusivamente para proveito próprio, como já aqui foi referido. Nestes termos, os homens são os mais peritos e, para lá das consequências que podem abalar todo o universo, existe a possibilidade de se manchar a jornada meritória que foi percorrida até se alcançar esse poder que permite fazer a diferença. Quando, em plenos tronos, a resistência e a tentação do Anel se combinam com a fragilidade com que já nascemos, segue-se uma queda que pode manchar anos e anos de muito trabalho, esforço e sacrifícios. Aconteceu com Isildur quando derrotou Sauron, aconteceu com Boromir quando tentou tirar o Anel a Frodo em Parth Galen, acontece ainda hoje com as personalidades mais ricas, poderosas, ou mediáticas.

Em resumo, Sauron recuperou o poder graças a um conjunto de más decisões (despreocupação e menosprezo) daqueles que o derrotaram anteriormente, o que permitiu à sua Resistência ficar cada vez mais forte com o passar dos dias, ao ponto de se ter tornado quase insuperável. Daí que a jornada até ao Monte da Condenação tenha requerido a contribuição de todos os seus inimigos, cada um acrescentando a essa demanda os seus maiores talentos. Assim também o é no plano colectivo do que está à nossa volta. Fechamos os olhos ao que está a acontecer à nossa volta, fingimos não ver ou ignoramos, e quando já não podemos enfrentar esses problemas sozinhos, somos obrigados a forjar alianças com quem partilha as nossas ideias e intenções (a Irmandade do Anel). Mas o mesmo se passa no âmbito do foro pessoal. Quanto mais cedermos às influências do Anel do Poder que carregamos, mais difícil se torna, em solitário, recuperar, nem que seja apenas por breves momentos, esse controlo das nossas vidas, a não ser que alguém nos dê a mão.

Por último, não sabendo se a escolha de Tolkien em fazer regressar o Anel ao local onde foi forjado teve algo de inocente ou não, essa decisão parece-me ser uma das chaves para enfrentar diariamente a Resistência, com todo o vigor quanto é necessário. Porque regressar às origens, à simplicidade da nossa vida, isto é, sem as coisas externas que dela fazem parte (e que a qualquer momento podem desaparecer): despojar o ego e as conquistas, as tristezas e os falhanços passados, e limitarmo-nos a Ser, apenas e só a Ser, é o que melhor desafoga a nossa mente e nos permite avançar com o que sentimos que devemos fazer. Os hobbits são os que estão mais próximos disso, até porque nunca daí se afastaram muito, ao contrário das outras espécies que, por iniciativa própria, cultural, ou porque foram aliciadas, bateram o terreno para lá do horizonte e lançaram-se à descoberta e a novas conquistas. Daí que a gente pequena acabe por ser a grande protagonista de toda esta história, mas cujo sucesso não seria possível sem a vigilância e o acompanhamento daqueles que não foram capazes de acomodar devidamente os seus novos poderes, possibilidades e responsabilidades. Estes últimos já conhecem muitos dos perigos que se podem atravessar no caminho. Tropeçaram neles, anteriormente. E quando se trata de uma grande transformação, de um marco histórico, a simplicidade por si só não basta.

Além disso, nem sempre podemos escolher o papel que queremos assumir. Não depende só de nós a abordagem a uma vida simples, complexa e gloriosa, ou até mesmo de liderança e orientação. Possivelmente até acabamos por assumir todos estes papéis ao longo da nossa vida, consoante as jornadas do momento, por mais que tentemos fugir deles. Nunca estamos livres de desgraçar a nossa vida, mas parece evidente que quanto mais batalhas conseguirmos ganhar contra a Resistência, nesta guerra interminável, mais probabilidades teremos de manter Sauron confinado nas profundezas da Terra Média.

Por hoje é tudo. Amanhã, é dia de nova viagem até ao Monte da Condenação, com o Anel do Poder ao pescoço.

 

Nota: O autor escreve de acordo com o antigo Acordo Ortográfico.

 

Ligado ao desporto desde pequeno, deixei definitivamente o futebol em 2016 para me dedicar afincadamente ao atletismo. Desde aí que muita coisa mudou na minha vida, a qual não imagino sem o desporto.

O Vida de Maratonista nasce então da minha paixão pelo atletismo, com contribuição especial da minha Licenciatura em Engenharia Informática, que me permitiu criar a solo este espaço de aventura e opinião, e torná-lo agradável a quem o visita.

Este artigo tem 0 comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Back To Top