Como alguns de vocês devem estar recordados, em Setembro de 2019, iniciei aqui uma rubrica…
Gerir o treino anaeróbico em função do stress diário!
O mistério em relação aos desempenhos inesperados que por vezes temos (sejam eles negativos ou positivos) vai sempre existir. Nem que seja numa percentagem muito reduzida, mas haverá sempre ponta de dúvida sobre a nossa avaliação ser correcta. Este ano, após completar a Maratona de Sevilha, reflecti sobre o meu fraco desempenho e apontei o dedo ao stress! Hoje, devido ao meu estudo contínuo, estou ainda mais convicto dessa minha tese.
Passo a explicar. Este mês, numa leitura mais holística sobre as provas de resistência, que se transformou na fonte deste artigo e é da autoria do Dr. Phil Maffetone, dei por mim a ler uma explicação mais detalhada sobre o cortisol, também conhecido por “hormona do stress”. O que vou dizer pode parecer básico. Todavia, como em tantos outros temas, talvez só se acenda uma luz de entendimento na nossa cabeça depois de se falar sobre isto. Isto costuma acontecer comigo muitas vezes, e esta foi só mais uma.
Treino anaeróbico: uma variável extra no stress diário!
O treino intervalado, também denominado “treino de séries”, é presença assídua no plano de treino da maioria dos atletas. Ora, não estando a evolução directa da nossa capacidade atlética exclusivamente associada a este tipo de treino (longe disso, acredito eu!), indubitavelmente, neste tipo de exercício saímos claramente da nossa zona de conforto. Isto é, tentamos levar o corpo a ritmos e esforços físicos que este há muito esqueceu, ou que até nunca conheceu. Pois bem, este tipo de trabalho, ao contrário de um treino confortável, é claramente uma forma de stress. Mais outra para juntar às que acumulamos no nosso dia a dia, para lá do atletismo!
Por outras palavras, naquelas alturas em que andamos mais stressados nas nossas vidas, por quaisquer que sejam os motivos, o treino anaeróbico pode ser mais prejudicial que benéfico, se não for bem medido. Como é fácil de entender, sobre isto não há uma regra ou equação a aplicar, pois todos somos diferentes. Assim, em alturas mais atribuladas, cada um saberá melhor do que ninguém se ainda pode somar, ou não, mais stress ao seu dia/semana, com a inclusão de treinos anaeróbicos. Longe de ser especialista, o que pretendo é deixar este tema no ar, como tenho feito neste espaço com tantos outros que considero relevantes para a práctica desportiva.
O rendimento desportivo está muito para lá do treino!
Todos nós, arrisco dizer, temos a tendência natural de atribuir os méritos do rendimento desportivo de um atleta ao seu treino. Um comportamento idêntico ao que fazemos com as pessoas ou os livros, cujo primeiro impulso é avaliar pela beleza exterior. De facto, no que ao atletismo diz respeito, não será por acaso que os artigos que supostamente revelam os treinos dos atletas de elite têm tanta procura e, erradamente (contra mim falo!), são colocados em práctica à letra, quando isso tantas vezes está longe de ser recomendável.
A explicação é tão simples que nos esquecemos que está mesmo ali à nossa frente: as nossas vidas são todas diferentes! Para exemplo, vejamos dois casos distintos. Primeiro, o de um atleta que, diariamente, tem de cumprir com as suas obrigações profissionais, familiares, e a isso somar o compromisso com o treino que, no caso de ser anaeróbico, implica mais stress. Em segundo lugar, o caso um atleta que tem a possibilidade de se dedicar exclusivamente ao atletismo e assim evitar uma panóplia de “dores de cabeça” que uma vida profissional extra-atletismo lhe provocaria. Sem resultados concretos, dá para perceber que o stress final acumulado ao final do dia é diferente nas duas situações. E porque todos temos momentos emocionais mais e menos felizes, esta variável também terá o seu peso particular em cada um, consoante a fase que atravessamos a este nível.
Conclusão? Evitar níveis elevados de cortisol
Desta forma, e sem ir à procura de tal, até porque a minha Maratona de Sevilha pertence à Era Pré-Covid-19, encontrei ainda mais sentido no artigo que na altura escrevi sobre o meu desempenho por terras espanholas. O stress que me envolveu na semana antes da prova terá feito disparar os níveis de cortisol no meu corpo que, segundo Phil Maffetone, interfere com vários processos relacionados com os músculos e o metabolismo.
Mais importante do que isso, com a escrita deste artigo espero cimentar estes conhecimentos recém adquiridos, e que a meu ver fazem sentido, deste ponto de vista mais holístico sobre o desporto. Da próxima vez que tentar perceber porque os resultados não estão a aparecer, ou na dúvida se devo incluir mais um treino anaeróbico na preparação para uma prova, o mais certo será parar um momento e reflectir sobre o stress acumulado em dias anteriores.
O stress é a doença do século XXI? Já se fala nisto há muito tempo. Então, talvez valha a pena pensar mesmo duas vezes sobre o assunto, a fim de evitar rebentar com a escala que somos capazes de acumular. Bons treinos 🙂
Nota: O autor escreve de acordo com o antigo Acordo Ortográfico.
Foto de Capa: Caleb Oquendo no Pexels
Estou gostando muito das suas análises e o quanto se preocupa com a melhora da sua performance. Parabéns e obrigada pelo conteúdo.
Mais uma vez, obrigado Thais 🙂